Por que muitos escritórios de advocacia lucram menos do que deveriam e como mudar isso com gestão financeira de verdade

Não são raros os casos em que escritórios de advocacia com boa reputação, carteira ativa de clientes e equipe técnica qualificada enfrentam dificuldades financeiras crônicas. A sensação de “trabalhar muito e lucrar pouco” é comum entre sócios que, mesmo com a agenda cheia, percebem que o escritório não gera os resultados esperados no final do mês. O problema, na maioria das vezes, não está na falta de trabalho, mas sim na ausência de uma gestão financeira sólida e estratégica.

A precificação como ponto de partida (e de erro)

O erro mais comum — e também o mais negligenciado — está na precificação. Muitos escritórios definem seus honorários com base em critérios frágeis: o “preço de mercado”, a concorrência, a capacidade de pagamento percebida do cliente, ou ainda o valor que “parece justo”. O problema é que essas referências ignoram completamente a estrutura de custos do escritório e a margem de lucro necessária para a operação ser sustentável.

Sem saber quanto custa, de fato, atender um cliente ou conduzir um processo, o escritório corre o risco de oferecer serviços abaixo do seu custo real. Isso acontece com frequência em contratos mensais mal dimensionados, ações judiciais complexas precificadas com base em tabelas defasadas, ou consultorias que demandam tempo e responsabilidade, mas são tratadas como complementares.

É preciso compreender que precificar não é apenas definir um valor. É projetar receita com base em custos, metas de lucratividade e estratégia de posicionamento. Um escritório que conhece sua estrutura de gastos, calcula corretamente o valor da hora trabalhada e entende o ponto de equilíbrio da operação tem mais segurança para definir seus preços, justificar seus honorários e tomar decisões com base em rentabilidade.

Custos, despesas e a falta de clareza na operação

Outro fator que impacta diretamente na lucratividade é o descontrole ou a má classificação dos gastos. Muitos escritórios sequer têm um plano de contas estruturado, o que impede a visualização clara de onde está o dinheiro. Gastos essenciais acabam misturados com supérfluos, e custos diretos da atividade jurídica (como pagamento da equipe técnica, diligências e softwares jurídicos) aparecem somados a despesas administrativas, como aluguel, internet e marketing.

Essa ausência de organização financeira compromete qualquer tentativa de análise realista dos resultados. Um escritório que não consegue separar custos de despesas não sabe qual é sua margem de contribuição, qual área jurídica é mais lucrativa ou quanto precisa faturar para cobrir sua estrutura. Mais do que isso, perde o controle sobre os gargalos financeiros e deixa de identificar oportunidades de economia e eficiência.

Com um plano de contas bem definido, é possível analisar a operação por área, por sócio, por tipo de serviço ou até mesmo por cliente, extraindo insights valiosos que permitem ajustes finos na estratégia comercial, no modelo de atendimento e na distribuição de esforços da equipe.

Retiradas desorganizadas e lucros fictícios

Além da precificação e do controle de custos, a forma como os lucros são distribuídos entre os sócios também compromete o desempenho financeiro. Em muitos escritórios, as retiradas são feitas com base em uma “percepção de merecimento” ou simplesmente para cobrir necessidades pessoais, sem qualquer vínculo com a real geração de caixa do negócio.

Isso gera desequilíbrio na operação e impede o escritório de formar reservas, investir em melhorias, estruturar o time ou atravessar períodos de baixa arrecadação. Lucros são distribuídos sem que sequer exista lucro real — muitas vezes utilizando recursos que deveriam ser destinados ao capital de giro ou à manutenção da operação.

É fundamental que a distribuição de lucros esteja vinculada a critérios técnicos, a partir da apuração dos resultados mensais, com regras claras sobre o que será destinado aos sócios, o que será reinvestido no escritório e o que será mantido como reserva estratégica. Profissionalizar esse processo traz previsibilidade, reduz tensões internas e fortalece a sustentabilidade do negócio.

A gestão financeira como alavanca de crescimento

A boa notícia é que esse cenário pode ser revertido. O primeiro passo é encarar a advocacia como um negócio e adotar práticas de gestão financeira estruturadas e consistentes. Isso passa por:

  • Criar e manter um plano de contas adaptado à realidade jurídica, com categorias específicas que permitam uma visão clara dos números do escritório;
  • Desenvolver uma precificação técnica, baseada na estrutura de custos, metas de rentabilidade e valor percebido pelo cliente;
  • Implementar indicadores financeiros periódicos, como margem de contribuição, lucro líquido, rentabilidade por área e desempenho por equipe;
  • Estabelecer um modelo de distribuição de lucros equilibrado, com regras objetivas, alinhado à saúde financeira do escritório;
  • Elaborar um orçamento anual e projeções de cenários, para guiar o crescimento com base em metas concretas e números reais.

Não se trata de transformar advogados em contadores, mas de trazer à mesa uma cultura de análise, planejamento e decisão fundamentada. Escritórios que adotam esse tipo de gestão colhem resultados superiores: aumentam sua rentabilidade, têm mais segurança para investir, conseguem atrair e reter talentos e, principalmente, passam a ter domínio sobre o próprio futuro.

A advocacia do século XXI exige mais do que competência jurídica. Exige visão empresarial. E nesse cenário, a gestão financeira não é um acessório — é a espinha dorsal de um escritório próspero, seguro e preparado para crescer.

Fernando Henrique de Oliveira Magalhães

É graduado em Economia pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP), turma de 1985. Sua formação de base foi concluída no Colégio Santo Américo, onde finalizou o ensino médio em 1981.

Ao longo de sua trajetória, construiu uma base sólida em gestão, estratégia e finanças, com ênfase especial na estruturação e desenvolvimento de negócios. Em 2018, concluiu o curso de Planejamento Estratégico para Escritórios de Advocacia na GVlaw, da Fundação Getúlio Vargas, e participou do programa “Melhores Práticas de Gestão de Escritórios de Advocacia”, promovido pela TOTVS. No ano seguinte, aprofundou sua atuação no segmento jurídico com a especialização em Gestão Jurídica Estratégica pela FIA – Fundação Instituto de Administração.

Sua experiência também se estende ao varejo e ao franchising, tendo concluído diversos programas voltados à gestão e desempenho operacional. Entre eles, destacam-se os cursos “Finanças para Varejo” e “Gestão de Lojas e Negócios”, ambos promovidos pela Growbiz, além do “Programa de Treinamento para Gerentes de Varejo” e “Técnica de Vendas para Varejo”, ministrados pelo Grupo Friedman. Também integrou a “Franchising University”, iniciativa do Grupo Cherto, voltada à profissionalização da gestão de redes de franquias.

Além disso, possui fluência em inglês, tanto na comunicação oral quanto escrita, resultado da formação completa — do nível básico ao avançado — cursada na Associação Alumni entre 1987 e 1990.

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